'S.T.T.L.'

‘S.T.T.L.’

À rutilante ex-aluna,

hoje estudante-escritora e

sempre terna eterna amiga,

ELIANA GALVANI.

Num impulso,

em fúria,

rasgo em tiras

extensas cortinas.

Curto horizonte se descortina...

Ao longe,

do primeiro andar,

luzes da cidade...

Um recorte,

a vidraça é moldura.

Contíguo, mais à distância,

o ex-distrito,

cidade interpolada n’outra;

unidades, retalhos de uma história... outra Matriz.

Interpolatriz,

quanta ânsia histórica! Mal contida, atada

à conquista! Tudo por um triz.

Bato de encontro à parede,

ao fundo;

doem meus ombros.

À frente,

a tela estrelada.

Quanto assombro!

A lua nua, cheia,

paira baixo,

em fundo negro-azulado

rútilo granulado de estrelas.

Rua XV...

Agonia.

Eu irado,

em êxtase...

Estendo os braços!

Crucificado,

feito quadro,

em meio aos retratos fixados,

em preto e branco...

Que tormento!

Pregado,

braços abertos, doridos,

mãos ensangüentadas.

Sondo a madrugada,

dor n’alma

alm’alamada,

enlameada, envergonhada, difamada, esfomeada,

atormentada, acorrentada, dilacerada,

rasgada, exposta em postas em meio a tiras

de cortinas...

Desabo ao chão.

Silêncio, coração!

Riso amarelo,

‘risum in lacrimis vertit’,

mãos e pés feridos,

encharcados, ensangüentados...

Meus gemidos

sussurrados, murmurados,

amaldiçoando e abençoando

no espelho

pulso-impulso

expulso o sangue vermelho;

jura, injúria, perjúrio,

quebro espelhos

corto, recorto

minha pele,

e os astros

feito testemunhas

acompanham o rito, o grito, o flagelo

do sacrificado;

os retratos atirados ao chão, os cacos de

vidros espalhados

perfuram meus pés;

molduras, fotos, rostos

testemunham

e se lambuzam

de sangue

colérico

em ato de fé.

Fantasmagorias ‘ridendo’... julho invernal, infernal!

Angelus,

ó desvios que a vida me impôs!

Arde uma luz

lusco-fusco

amarelada,

ao longe,

numa torre,

da cidade além cidade

Santificada,

e o cruciFicado,

laçado em desamparo,

por desalmadas rusgas!

Chispas de ódio,

armado d’olhos

feridos,

rubras lágrimas o lançam a

mares doce-salgado:

_ Tchau, Sylvius...

_ Bye, Sylvius...

_ Au revoir, Sylvius...

Amarodoce sal.

Je touche

your cold heart,

com sangue ardente

‘nigro notanda lapillo’,

e afasto o negro véu de

Ísis.

Martírios: palavras, juras, encontros, canções,

promessas, cartas...

Mentiras! Armadilhas...

Vem sendo minha vida, sim!

Não, vencendo!

Aos trancos, aos trocos, aos solavancos,

escalando barrancos,

esbarrando em escolhas...

Um murro

na boca do estômago...

Trilhas...

Minha vida é...

Ilhas desertas,

sans amour...

Olha a lua!

Lua cheia.

Olha o ventre

da lua!

Grávida de

rebentos!

Olha a lua!

Que procria,

que recria,

noite não-dia,

os anjinhos

que lhe protegerão.

E ela gerará prole d’Angelus...

Olha a luta!

Tão esplendorosa,

da lua,

lua cheia, a luta da lua

em dores de parto,

parindo estrelas, anjinhos e carinhos,

e eu os partilho.

A jornada se foi...

Tão-somente as sementes

da lua, da lua cheia, da lua parindo,

e eu na rua,

a venerar

lua n’alma,

lua calma,

lua me acalma.

Tão-somente a lua, de passagem,

em viagem noturna a

acariciar a paisagem.

Meu dorido peito,

me protege,

ó Luna!

Diadema azulado.

‘Caritas!’

A lua respira

Cala!

Caça minhas palavras ao vento...

Do ventre da lua,

da lua testemunha,

a noite resplandece tranqüila;

intranqüila é minh’alma,

me acalma, ó Luna!

Suspiros da lua

Ouça!

A rosa lua...

Veja!

Lua parideira,

derradeira,

luz rosa-luna

roça

meus cílios, pois

perdido sou, em bosques medonhos, escuros.

Põe-me a sonhar...

... um murro no rosto... ‘S.T.T.L.’

... profundo desgosto.

... ‘Sol Lucet Omnibus!’

PROF. DR. SÍLVIO MEDEIROS

Campinas, verão de 2007.