Súplica de Dor Incauta
Deus perdoa-me, porque sou fraco.
Pois na vã loucura ouso estar na presença dos músicos e dos poetas,
Mas, na verdade, aproveito os meus restos para ter o que comer.
Porque a noite fria da minha brutalidade retorna
E estou debilitado para suportar o sofrimento.
Perdoa-me, Deus, pois não entendo e quando entendo não tolero.
Apesar da doçura que sustenta meus pés, consterna-me o peso de 10 mil amarguras.
Embora aspire à bondade, às vezes sinto-me feio e mau como um anjo de cabelos tristes.
Absolva-me, porque olho no espelho e me vejo turvo e calvo das alegrias.
Ainda que tenha cantado o amor e o recanto quente da casa que a luz da estrela central invade,
Morri, assim como a tempestade morre no leito do rio que alaga.
Absolva-me, pois quando chegam os relâmpagos e os trovões tremo
E não tenho voz para cantar uma oração.
Não estou tísico, mas meus suores noturnos estão cheios de pavor.
O peito dói, não tenho fome, tampouco disposição para os sonhos.
Estou acovardado para carregar as flâmulas dos meus intentos.
Perambulo pelas noites da rua e uivo como um cão alienado
Que evoca a tristeza de seus ancestrais castigados.
Bebo o afeto profundo em um copo de água suja e não distingo os sabores.
Perdoa-me, Deus, pois que vejo a violência dos Homens e não me abstenho.
Por discutir a invariável forma que se transforma em argumento
E perder-me da mentira da explicação.
Porque recolho como um miserável as moedas caídas,
Espalhadas por um tapa em minhas mãos mendicantes.
Porque congela-me o estômago pensar que amei
Como alguém que tem fé em um Deus que não existe.
Tento subir à superfície, mas o sofrimento é profundo como o oceano,
Não tenho fôlego pra vencer tamanha distância.
Perdoa-me, Deus, pois, se és amor, atiraste-me do céu como um anjo caído.
Meus ossos estão quebrados e a dor me impede de rezar.