PROSTITUIÇÃO EMBRIAGADA

Saí vestida de esperança

Encontrei homens bêbados

Deparei com mulheres profanas

Esbarrei em crianças famintas

Na retina do meus olhos a mancha

da aridez humana...

E toda aquela esperança

desmanchou em agonia

As palavras com as quais me vesti no entusiasmo

perderam-se na boca da minha alma

Os sons sufocados implodiram

nesse esvair sem sentido

E só me restou poetar

para falar de sonhos destemidos

Evocar os homens de boa vontade

para que as nossas crianças

sejam alimentadas em carrosseis

cobertas de lonas brilhantes

Invocar a lógica indomável

do viver em solidariedade

do cirandar com a fraternidade

Restou também nesse sonhar adolescente

a boa vontade

a fé de aço

o impulso ardente

a coragem da rebeldia valente

Por isso

mesmo na perdição do nosso mundo

no inconformismo da indignidade

no desequilíbrio da lucidez

ainda consigo ver brilho na rosa desbotada

Consigo ver trigo transformado em pão

Consigo acreditar na humanidade

Consigo ver você que me lê como irmão

Consigo enxergar a luz dos meus olhos

na sombra de todos os corações

que não podem mais sonhar e nem acreditar

Consigo ainda imaginar

a prostituição embriagada

transformada em infância

acordando os bares

jorrando leite e água

na boca da criança abandonada.

Sandra Lúcia Ceccon Perazzo

2/12/2006