TEMPO BOM PARA TERREMOTOS
posto fora o lixo
fica a casa, vazia.
do chão imaculado
à brancura da pia.
as janelas translúcidas,
os cinzeiros tinindo.
a latrina desinfecta,
os espelhos sorrindo.
posto fora o lixo,
fica o nada.
o eco no corredor,
as almas na escada.
o cheiro de varsol,
o cheiro de jasmim.
o reflexo das panelas,
a terra fresca nos xaxins.
posto fora o lixo,
fica a ordem.
me perco nesta hora,
saudoso da desordem.
uma higiene incômoda,
limpeza, esterilização.
água de mangueira,
espuma de sabão.
posto fora o lixo,
fica esse aconchego burguês.
de lar doce lar,
de mamães ninando bebês.
de família diante da tv,
disfarçando sua hipocrisia.
de gente dizendo que quer,
quando, na verdade, não queria.
posto fora o lixo,
fica a nudez.
a mudez,
a insensatez,
a sordidez
do bom gosto.