À ESPERA DE DEUS
Com os olhos borbulhando
Sem conseguir evitar olhar
Espero, noite após noite
Que Deus habite este lugar
Um Deus amplo, acolhedor
De braços longos e quentes
Que abrigue toda essa gente
Faiscando de pavor
O medo de estar vivo
O medo de estar sóbrio
O medo de mais um dia
O medo de todos os dias
Em tão rápido passar
Apenas riscam a vida
Crendo-se sempiternos
Correndo a coxia
Esperando Deus em sua chegada
Fico, o parvo, observando
Os homens pela madrugada
Como tochas se apagando
O velho que puxa a carroça
A mulher que serve o café
A moça na janela do trem:
Rosto emoldurado em ferro
Fumaça, sonhos e aço
Eis a salvação
Todos à procura de abrigo
Aguardando revelação
Com seus instrumentos tortos
Vão construindo suas certezas
Rolam dados em busca da sorte
Que não os quer por consorte
Canso-me de esperar por Deus
Observando meu descrédito
Ele sequer se ergue
Quando meu coração se verga
Quatro cadeiras na casa
O homem se senta
Separado do ser;
A razão e a emoção descansam
Na cama, apenas o corpo
Peso, volume, massa
Guardado por seus apetrechos
Sentados, insonos, de guarda
Sem êxtase, o gozo jorra
Para que a vida tenha forma
Antes que o cansaço me vença
Ofereço-me a Deus em oferenda