A MIL POR HORA
Quis justificar minha geração
justificar essa geração a mil por hora
que me permitiu
Capricórnio ascendente Aquário
terra e ar
que abrigam os pássaros,
justificar esse algo feito asas
que se apelida Poesia
e que me liberta,
justificar os golpes e contragolpes
que estão em nossa pele
até mais que em nossa memória,
justificar meu filho que ainda não veio,
a mulher que amo
e a falta de aliança no dedo,
justificar as olheiras na manhã de segunda,
o desgosto e a luta,
nem esquerda, nem direita, nem centro,
muita acima destes imbecis
do DETRAN ideológico,
justificar o 10º andar,
a janela para o improvável,
a barraca e o camping,
o violão e o microfone,
o palco e a solidão a dois,
justificar a criança que já não vejo
no espelho
mas que sempre escapa ao meu controle,
justificar o direito de sonhar
e a vontade de fazer,
a força do silêncio
que às vezes diz muito mais aos olhos.
Quis justificar qualquer passo
que valha o risco
e o abismo,
qualquer beijo que não traia,
qualquer temporal que não seja dilúvio,
o vento de outono
e cada folha que cai...
Mas a gente nem conhece as pessoas,
esses faróis que rompem a neblina
e dissipam a obscuridade,
que jogam a água das poças
nas calçadas da cidade,
a gente nem conhece a vida,
esse ponto vazio chamado destino,
a gente,
mal e mal,
conhece as curvas da estrada
e ainda assim
derrapa...
(Parte integrante da peça "Sobre o vôo", de William Mendonça. Direitos reservados)