LÁBIOS MAIS GOSTOSOS
Buscando o que não sabia, nem deveria tentar,
entrei de relance naquele pomar de desejos amanhecidos e estarrecidos de tantas luz,
saqueei de suas entranhas o voto vencido do silêncio.
Fui nas ancas do sonho me resvalar dessa bebedeira infernal,
arranquei esse pus grotesco que se fazia passar por andarilho imberbe das noites de verão, das cantadas de forró entorpecido,
desfalquei as ventosas que insistiam em berrar frases sem efeito,
feito palhaços tresloucados sem fé nem cabeça.
Depois me entorpeci da sua saliva até afogar cada pedaço da minha sina, e da minha rima,
voltei para tua barriga feito ave de rapina em vôo cego,
armei a cilada que, por fim, nos levaria ao cadafalso que, outrora, fora nosso derradeiro ninho de amor. Saudade dele, amiga.
E fui além, arranhando as margens desse folguedo com unhas ruídas e puídas, encardidas até o último fio de cabelo,
busquei atalhos onde só vazavam espinhos, onde só marchavam fugitivos,
tentei mirar no alvo mais a minha visão míope mais uma vez insistia em turvar o que se via da varanda.
Fui nesse bafo encardido, calado e mofado,tentar entender o que você teimava em dizer, certamente para calar-me sem trégua,
despertei aquela ama-seca que doava seu peito para que eu pudesse entrar nesse jogo,
abri cada botão da sua blusa com mongeana angústia que nunca consegui reverter, nem coar a frio.
Depois de tantos faróis fechados e baús trancados, o que encontrava eram lábios que, até então, se faziam passar por outros serafins,
por coronéis bêbados e pelados naqueles quartéis que conhecemos tão bem.
Eram lábios aventurosos, soturnos, orquestrados numa manada que a savana há muito ansiava por dedilhar, por laçar suas amarras sem piedade.
E neles mergulhei feito carola pedida, feito gozo estrupiado do seu roteiro, feito mancha que nunca mais sairá da nossa cena,
nem da nossa canção.
Foi uma loucura tirar cada teco fedido desse embrulho atirado ao léo, desse frasco de perfume que agora suava cuspe rançoso de final de festa, de ônibus perdido.
Depois dessa farsa que se fazia menina, mulher, mãe, filha e muita coisa mais, entendi o que cada travesseiro que a gente amassava queria nos dizer, sufocado pelo peso dos nossos corpos entrelaçados sem arremate.
Entendi que por trás da sua raça escorada pela rapinagem descomunal de forasteira das nossas almas, havia muito o que ser untado e colocado para dormir. Talvez, até, esquetejado com todas suas amarras, âncoras e pocilgas.
Entendi que você não tinha vindo só para trazer a conta, ou reclamar do barulho dos ventos. Nem, tampouco, para ranzinzar ainda mais meus acordes tortos e pouco gentis.
Também não estava lá só para representar aquela hipoteca dissimulada ou, por certo, desfraldar o que eu tinha de mais rico, mais farto e, sobretudo, de mais honesto e resgatável.
Você veio para ensaboar cada poro que eu poderia sucumbir até rodopiar num boeiro encardido e traiçoeiro. Num pedaço de bolo velho, seco e plenamente duro.
Você estava lá para dizer o que as horas deveriam ter infectado, mas que, no fundo, servira só para nos enxarcar de raiva, pena e
um desprezível ignorar. Somente isso.
E que agora tudo se passava por rapariga disfarçada de sorriso, ou por alguma saia amassada que nunca será usada em dia de festa, nem dia de fresta.
E que, se pudermos nos respingar de novo, iremos à forra para esse festim tão querido, tão amado e tão infinitivamente gostoso e uterinamente triunfal.
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