QUANDO O CANSAÇO VEM
Quando o cansaço vem, vem estourando sua manada,
parece gole no oásis que não chega nunca ao fundo,
parece suspiro do primeiro amor que a gente está sempre esperando ter algum dia, algum repente qualquer.
Quando o cansaço vem, ninguém fica rente,
derruba velhos, moços, todas as peças do dominó,
e, sem mostrar senha ou pagar ingresso, entra em cena pra domar toda nossa carranca mais furiosa.
Quando o cansaço vem, o sol pede licença e sai em férias,
pega a nossa atenção e manda aos confins de onde nunca fomos ainda, mas de onde sempre viemos um dia,
faz o que sabemos virar confete de carnaval.
Quando o cansaço vem, as horas ficam desnudas e saem do sério,
o medo fica refém das nossas ciladas, as unhas começam a se roer sozinhas até ficar só carne-viva,
transformando o nosso caminho em luvas que nunca mais caberão na nossa mão, nem na nossa gaveta, nem na nossa braguilha.
Quando o cansaço vem, não adianta chiar nem bater o pé,
ele é soberano nas suas manhas, pegadas e varandas,
quem for capaz que faça reverência, ou arrede o pé dali,
quem for maluco que entorne o seu caldo pra ver o que sai dessa carcaça,
que for amigo que tire o chapéu e espete nele o sorriso mais folguedo que puder, que quiser. Ou, por certo, que tiver.