A feiticeira
A feiticeira, sentada, parecia meditar.
Entretanto, estava a espera,
Ocasionalmente acrescentando
Novas notas a seus pergaminhos,
A mente exausta,
O ouvido alerta.
Havia tanto a aprender
Antes de seu mestre voltar.
Dama exemplar de outrora,
Que decidiu outro caminho trilhar,
Após diversos desenganos,
Após sua obra alguém desrespeitar.
Qualquer um teria ousado enfrentar,
Abertamente,
A idealista guerreira,
Que fora transformada em escrava,
Pouco mais que uma reles rameira,
Num passado já distante,
Do qual ela tentava esquecer,
Mas a memória não queria se apagar.
Mas ninguém, atualmente,
Ousaria encarar a ruiva feiticeira,
Cuja face pálida e sorriso frio
Apavoraria qualquer um
Que, temerariamente,
Dirigisse a ela um único olhar.
Espreguiçando-se luxuriosamente,
Ela irritou-se com o arrastar do tempo,
Com o langor das horas,
Com a espera e a demora,
Pois não queria mais esperar.
Nesta hora a porta se abriu,
Dando passagem ao senhor daquela fortaleza.
Um sorriso sincero se abriu no rosto dela,
Irradiando beleza,
Apesar de nem um movimento esboçar.
A cada passada dele,
A armadura ressoava notas metálicas,
Incessantes.
Notas duras, ressoantes,
Que se espalhavam pelo ar.
A mão forte estendeu-se na direção dela,
Que levantou-se, langorosa,
Como uma gata a se espreguiçar.
Ouviu-se então uma voz poderosa,
Em um misto de ordem e pedido,
Que a fez se apressar.
“Vinde a mim, feiticeira”,
disse o senhor do castelo
“É hora de teu conhecimento testar”.
E sem mais palavras,
Ela aceitou a mão que ele lhe oferecia.
O dia a muito já partia,
Mas a noite mal começava.
E conduzida através dos longos corredores,
Repletos de sombras entre sombras,
A feiticeira sorria.
Era hora de mostrar a seu mestre o que aprendera.
E hora de recompensa-lo por seus ensinamentos.
Disso era feita sua vida.
De estudos e diversos momentos,
Onde o certo e o errado,
Não cabe a ninguém julgar.
E enquanto o vento frio espalhava suas saias,
A música metálica da armadura se ouvia,
Sem parar.
Seda e metal,
Em uma estranha sinfonia.
Mestre e antiga escrava,
Agora aprendiz voraz.
E ao lembrar que dissera,
Em um já distante dia,
Que ao lado escuro ela se jamais renderia,
Por um segundo, ele a sentiu hesitar.
Mas uma pesada porta se abriu,
E a mão forte a conduziu,
Num misto de domínio e sedução,
Arrancando-a da breve hesitação,
Junto com um novo sussurrar.
“Esquece o passado.
Não és mais aquela mulher,
Nem tens porque nisso pensar.
Tu és minha, feiticeira...
Lembra-te sempre disto...
Mesmo que o tempo passe,
Ou que nosso mundo inteiro mude,
É tarde demais para ti voltar.
És minha em corpo e alma,
Pequena feiticeira...
Não há escapatória.
Nem a minha morte há de te libertar.”
(inspirada por um folhetim que, neste exato momento, não me lembro do título ou do autor - Quando lembrar, escrevo aqui)