Fantasma de Campos

Onde está meu tato

E meu olfato, se perdeu?

Minha audição? Zumbido...

Quero não só olhar, mas degustar as cores e os sons

Por que as pessoas me enxergam mas não me olham,

Por que passam sem que eu sinta seu cheiro, seu ar, sua presença?

Como desaprendi a degluti-las e sentir sua digestão em meu ventre?

Onde foi parar aquele arrepio “deus, existem outros, mais do que eu?!”

Já sabia que só se é quando não se é diante dos outros,

Vivendo outros humanos é que se é gente

O eu não importa, é uma abstração

O outro é que te faz ser

Simples, não?

Tão simples que não sei como desaprendi a pedalar a bicicleta

Agora só me resta o eu

Tão ilusório que nem Narciso explicaria

O nada...

O nada se tornando absoluto

Ectoplasma no lugar de pele

Sem poros, como estar no mundo, como senti-lo?

Para que comer se não for para, pleno, mirar o olhar alheio?

Para que caminhar se não há pernas com que cruzar e tropeçar?

Para que dormir se não há com quem desejar acordar?

Para que correr, se não se ganha tempo sem expectativas e esperas?

Sem olhos cruzando, os nossos só vêem o espaço expressionista

E o tempo como num quadro de Dalí, se o relógio não estiver em pulso

Logo devem começar a ver através de mim...

O horizonte se torna mais importante que uma forma sem contato

Logo sentarão em minha cadeira sem dividir o trabalho

E comerão à minha mesa sem confraternizar

Usarão meus óculos, “pra que enxergar?”

Calçarão meus sapatos, “pra que caminhar?"

Nem mais pedirão meu sorriso, já que não o escutam

O coração pulsa, a mente trabalha...

Mas para que, se é no espaço entre os corpos que há realmente vida?