REGADIO

Por aqui, hoje sim chove,

Mas é uma chuva doce e necessária,

Como doce e necessária

Faz-se a solidão à minh’alma segada.

Havia muito pó pra pouca estrada,

Muita boca seca pra pouca água,

E muito germinar pra pouco regadio.

Havia muita presença pra pouco coração,

Muitas palavras pra pouco ouvido

E muito estorvar pra pouca paciência.

Tua perversa permanência nas minhas horas quietas

Saqueavam-me os horizontes lúcidos

Banindo-os de meus olhos rasos de regalos.

Foste fátua.

Sensata, foste.

Quero agora ficar só.

Cabeça entre as pernas.

Um meu abraço em mim mesmo

Abraçando pernas e cabeça.

Olhos cerrados.

Deixar que minha boca se umedeça

Com a chuva fresca que me faz germinar

E que minha alma se entorpeça

Pelo silêncio que me restou santo

Com tua partida tardia.

Com tua partida vadia.

Tenho por aqui chuva e solidão doces e necessárias.