Legado
A tarde vinha a galope
Engolindo a nesga de dia
Prenunciando noite fria
Num poente púrpura cor
Cai o sol, e vem a lua
Emparceirada com a boieira
Clareando a cumeeira
Na quincha do velho rancho
De regresso para as casa
Um flete rasgava a noite
Tendo o vento por açoite
Saboreando a liberdade
Era só um peão de estância
Da lida de laço e sovéu
Foi curtido nas distâncias
Cavalo, mango e chapéu
Recostava o corpo cansado
Sorvendo do mate a essência
Sentia percorrer a querência
De alma terrunha nas veias
A vida se faz em ciclos
Quando um começa, outro termina
Semente nova que germina
Velho cerne que dá frutos
Quando os ossos já doidos
Não aguentarem mais o tirão
É hora de passar o bastão
No legado da existência
As botas e o velho basto
Marcados pelas batalhas
Não servirão de mortalha
A um velho homem do campo
De toda minguada herança
Sem posses ou riquezas
O pai, em sua rudeza
Entregará ao piá esperança
Depois de tudo arreglado
O guri com seu municio
O pai servirá ao ofício
De camperear no pago eterno