CIDADE DAS SOMBRAS
Da rua esquálida
Escuto o passar
Uma procissão de silêncio
Rostos amargurados
Decorando a escuridão da rua
E vejo ali os pobres
Carregando suas cruzes
Pesadas como chumbo
Por essas cidades do medo
E logo estarei ali
Vagando, sem rumo
A rua é minha casa
Lar dos temporários
Meros detalhes
Aqui, nesta noite de angústia
Fito a lua em seu zênite
E nela reflete meu ser
Perdido pelas galáxias
O luar, quase sangrento
Me banha com sua morbidez
Sinto o meu ser
O meu eu como nunca senti
E agora sei a verdade
Se era para estar aqui
Disso não sei
Apenas quero fitar esses rostos magros
Vagueando pela rua
E, olho nas janelas fechadas
Vultos esquecidos
Pedaços de alguém que foi
E agora não está mais
Sinto a implosão da dor
Em cada um de meus nervos
A dor é como fogo
Queimando sem ser visto
Ò, a quem um dia eu amei
Fuja para as colinas, lá é seguro
Longe de mim e dessa cidade magra
Nos sugando para sobreviver
Cidade das sombras
Sombra de um ocultismo
Terror e velhas bruxas
Decorando as paisagens
Se aqui eu vivo, neste momento
É porque não há outro lugar
Onde minha dor se expresse
Como aqui
Eu sinto um medo
Medo de existir
O medo de sentir
Cada segundo dessa vida
Vida como morte
Já que não é vivida
Nem tão bem servida
Para quem viver?
Dou um mais um passo na rua
Sinto o toque gélido da noite
Seu abraço frio como a morte
Me traz estranha calmaria
Aqui, nesta serenata para o medo
As palavras vazam de minha boca
Como água vaza da fonte
Fonte envenenada
Com as dores de meu coração envenenado
Pelos becos e vielas
Vejo vultos calmos e serenos
Passantes refletindo apatia
Eu não vejo nada além disso
E, ó
Chegamos ao cemitério!
Lar dos eternos
E a futura casa
Tão eterna quanto os que habitam
Pois nesse chão onde piso
Juro que já houve morte
Violência e morbidez
Numa cena de tragédia
Ainda sinto o gosto do sangue
Quando me lembro do que fiz
Aquela morte mal morrida
Testemunhada pela cidade velha
E hoje, com pesar
Reflito minha morte
Apenas uma passagem
Que me levou ao eterno
Pois foi aqui
Exatamente há alguns anos
Onde tirei minha vida do meu corpo
E caí na escuridão
Estranhas lembranças
Hoje de uma alma perdida
Que vaga por esta cidade
Sem saber por onde ir
Ó, luar que me assiste!
Mostre-me o caminho
Me leve para os que vagueiam pela rua
Para que eu possa estar com eles
Cada toque, cada sentimento
Tudo isso é valido
Quando se quer viver
Peço a este luar
Tão calmo e sereno
Que nessa cidade das sombras
Eu renasça, como uma fênix
Pronta para mais uma vida amargurada
Pois ter tudo para doer
Não é pior do que ter nada para sentir
E aqui eu imploro
Que se não me leves para o céu
Que eu possa estar mais uma vez aqui
Nesta cidade das sombra