O MENINO E A ÁRVORE
Noites no silêncio
Gritos na escuridão
Escuto seu ninar triste
Vindo dos vastos campos
Campos de medo
Sim, medo quente
Quente como fogo
Que queima até o âmago
Dançando no escuro
Um vulto, eu vejo
Pendurado na árvore
Como roupa no varal
Aqui jaz um homem
Que um dia se achou tanto
Tanto como o próprio Deus
E agora morreu
Como morremos todos
Então o fôlego vem em minhas narinas
Sinto o seu soprar
Acordo para o momento
No limiar do mundo, me vejo
Entre a árvore e o campo
Junto do corpo sem vida
Ó, meu Deus
Escutai minha prece
Ela vem de um coração amargurado
E cheio de medo
O medo é como fogo
Mas arde sem ser visto
Apenas queima nossa alma
Nosso ser
Aqui, neste campo faminto
Gravo minhas palavras
Nesse chão maldito
Que se até o anoitecer
Eu não estiver na árvore
Que me leve consigo
Juro como o tal
Que pode jurar sem medo
Esses campos viveram
O inferno de ser
E agora queimam
Com o medo do meu ser
Vejo árvore
Monumento
O corpo é só um detalhe
Mórbido como sangue
Ele lateja minha mente
O corpo, pendurado
Minha mente
A estudá-lo
Trabalha sem cansar
Seus detalhes sangrentos
Essa morte minimalista
Esse desencarne de medo
Tremo até os ossos
Ao escutar sua canção triste
“A árvore, antes nada, agora minha casa eterna”
Ó, corpo companheiro
Saiba que não estás só
Também farei da árvore
Meu lar do para sempre
E se até a noite eu não estiver lá
Que me leve consigo
Sou apenas um menino
Que aqui acordei
Mas a árvore me chama
Como uma mãe chama o filho
E o campo é meu pai
Testemunha de minha ida
Aqui, neste solo
Está gravado o meu medo
Medo do seio frio que me acolha
E prepara meu destino
Senhor, aqui me abandonaste
Neste crepúsculo de dor
E prometo
Que se até a noite eu não estiver na árvore
Que me leve consigo
Nesse estar escuro
Perto da noite, já silêncio
Algum passar no campo
E vejo atrás de mim, ele
Torment, senhor
Falai comigo
E me tira dessa dor
Que não acaba mais
Falo contigo
Como falo com um irmão
Pois somos irmãos das trevas
Entre torres e cemitérios
Por tudo que é mais sagrado
Pela lei de todos os homens
Que falham
Falham e falham
Falham como essa noite
Pela lei eu prometo
Com meu sangue a escorrer
De um corte passageiro
Juro para você
Aquele quem vi primeiro
Será meu companheiro
E se até a noite eu não estiver lá, na árvore
Que me leve consigo