A FOME É FERA
Logo pela manhã
Ela urra e berra
Aflige e tormenta
Um mundo abafado
Em desigualdade
E desemprego
É fome à espreita
Pela porta!
A fome é fera
Vem da selva
Para lá da serra
— Brava e voraz
Devora sonhos
E bem longe
A paz foge
A fome é besta
Revoltosa
E teimosa
Invade ventres
E brada impiedosa
(Induzindo alguns
Ao roubo e demais
Malvadeza)
É monstro bruta
Devasta a concórdia
Trucida esperanças
E arrasa famílias
Como fogo desabrido
A fome é fera
Empatia nunca teve
Pena tampouco
Nem mesmo
Com crianças —
Abala
Abate e devora
Deixando apenas
Vestígios dum futuro
Desfeito na sombra
Da desilusão
E desespero
A fome é fera!
Porém um mata-bicho*
Ou algo assim
Para todos nós aqui
Poderia bem matar
Esta horrível bicha
Com apelido
De Lombriga —
Houvesse justiça!
*mata-bicho = pequeno almoço (Angola).
Redigido em Kimbundu.
Tradução portuguesa do autor.