O espetáculo do Brasil
Ao contrário respira a plateia
bate palma, vibra
com a exposta artéria.
Era bandido, vagabundo,
da favela?
Enquadrado na tela
era mais uma matéria,
uma chamada sensacionalista,
um vídeo e umas curtidas...
O chefe aprovou o espetáculo
e riu da tragédia:
Fatalidade - disse –
Racismo – não existe –
e ficara por assim dizer
coisa daqui!
Anos atrás mataram um cão
usaram uma barra de ferro
ah quanta tribulação!
 
Meses atrás um homem morreu
e com guarda-chuvas foi coberto
ah quanta normatização!
De todos o cão foi mais lembrado,
inocente eles disseram, indefeso,
e de tanta condolência e comoção
pensei até que fosse gente.
Aqui a plateia respira ao contrário,
tira seus ódios do armário
e pra baixo do tapete a lama
de Brumadinho a Mariana,
o João Alberto e Amarildo,
o Rafael Braga,
o massacre da Candelária
carne de preto é carne barata
que o presidente mede em arrobas
e que escorre na veia aberta
da nossa triste descoberta.
Nós somos muitos
e muito pouco...