ENCOMENDA DE POEMA
Pediram que eu fabricasse
um poema pra ontem,
encomenda de gente
que paga bem.
Foi pedido que o poema,
por fora,
fosse assim,
vistoso,
de frases envernizadas
e adjetivos
em grau superlativo analítico.
Que,
por dentro,
eu o recheasse
com palavras macias
e de pouca fibra,
onomatopeias vocálicas
a perder de vista
e apelo especial
ao Divino nas entrelinhas.
Vou entregar, porém,
um poema puído
das palavras batidas
que costumo usar
e
esfacelado pelos adjetivos
perfuro – cortantes
que a vida
vai nos entulhando.
O recheio do meu poema é
o recheio da fome
de legiões.
Meu poema é louco.
Meu poema é laico.
Meu poema é tosco.
Meu poema é oco
como é
o véu da insanidade.