O Rei
Sentado em seu trono,
Os dedos batem no encosto,
Mantém ereto o tronco,
Sente profundo desgosto.
Observa com arrogância,
Sua vista limita-se ao salão,
Petrificado na ignorância,
Mede as coisas por dedução.
O indicador em riste,
Sua postura decrépita,
Um sujeito triste,
É mote de pilhérias.
Sua coroa é pesada,
Antes fosse de espinhos,
Mas por ser cravejada,
Pensa ter total domínio.
É fitado por súditos falsos,
Impõe o medo por puro receio,
Desejam colocá-lo num cadafalso,
Cuspiriam em sua face por recreio.
Sente envelhecer junto com seu reino,
Fita os objetos pomposos decorativos,
Seu gesto de cabeça é mecânico, puro treino,
Já perdeu aquele juvenil vigor físico.
O seu selo está quebrado antes do lacre,
A memória busca resgatar a genealogia,
O gosto consaguíneo tornara-se acre,
Olha a esposa sem reconhecer a rainha.
Quanto mais tempo sentado, mais rei,
Ao mesmo tempo, sente-se menos reinante,
Pensa que sua palavra é a própria lei,
Ainda assim é visto como instituição degradante.
Suas rugas revelam rupturas que agora pressente,
Seu falo, não mais ereto, é o retrato de sua impotência,
A catarata embaça sua visão, enxerga cegamente,
Um manequim senil que esbanja tradicional prepotência.
Seus cabelos grisalhos e a calvície exposta,
Seu traje que cobre o corpo que arqueja,
A voz rouca que cospe gotículas asquerosas,
Seu mando a cada dia que passa, fraqueja.
Cada dia a coroa fica mais pesada,
Comprime o cérebro já cansado,
A aflição se tornou uma fiel aliada,
Pensa que logo será dos vermes, pasto.
Mas sua imponente soberba ergue o semblante,
Os traços da fronte monárquica inspiram respeito,
Por mais que a glória de outrora esteja distante,
Procura um resquício de orgulho perdido no peito.