AMÉRICA LATINA
Na miséria mergulhada,
já parece escrita a sina,
sorte com lápis traçada,
desta América Latina.
A riqueza concentrada
nas mãos da mão que domina,
quem planta não colhe nada,
nem tem o mapa da mina.
Veja-se a terra cercada,
notem-se os portões da usina,
olhe-se a fome estampada
nos olhos fundos da esquina.
Sai um de nós pela estrada,
escorre o luxo, e buzina
a limusine importada,
cujo valor nem se atina.
Enquanto numa esplanda
um pacto burguês se assina,
morrem mil bebês em cada
beco, sem sequer vacina.
Eis, por fim, esta pedrada:
não se aprende nem se ensina,
pois nos falta à gurizada
mesmo o pão, lá na cantina.
Eh, América podada,
oh, América, latrina
da irmã, tão bem abastada,
até no globo por cima.
O sonho por que se inclina
minh'alma brasilizada
é não ver colonizda
esta América Latina.
[Publicado em “Mundo
Jovem”, Porto Alegre,
nº 250, abr. 1994]
Fort., 15/10/2008.