Biografia de um Zé qualquer

Permita que eu me apresente,

Sou apenas um Zé qualquer,

Que sempre diz o que sente

Mesmo até quando não quer.

Pois se a vida é um presente

Uma ressalva requer.

Fui nascido no interior,

Viemos para capital.

Um motivo superior;

Um acidente fatal.

Mas aconteceu o pior,

Foi notícia no jornal.

Nosso pai já não existe,

Minha mãe perdeu o marido.

A gente ficou foi triste

Sem o nosso pai querido,

Mas a família resiste

Com o coração ferido.

Estava só com oito anos

Quando a minha vida mudou.

Acabaram-se meus planos

Minha vida desandou,

Vivíamos como ciganos,

Minha sorte debandou.

Abandonei a escola

E nunca mais retornei,

Do que guardei na cachola

Muita coisa ainda sei.

Qualquer um não me enrola,

Quando ele vai eu já voltei.

Minha mãe foi empregada

Numa casa de família.

Ela saía de madrugada

Pra casa de dona Emília,

Que era recém-chegada,

Tinha vindo de Brasília.

Então eu sempre ficava

No barraco o tempo inteiro,

Dos meus irmãos eu cuidava.

Foi quando virei biscateiro,

Quando algum bico arranjava,

Cuidava deles primeiro.

Depois consegui emprego,

Fui trabalhar na construção.

O meu patrão era um grego

Dele eu não reclamo não.

Ele tinha muito apego

No resto era um bom patrão.

Agora trabalho em obra,

Pedreiro de profissão.

No canteiro o povo cobra,

Porque lá sou só peão,

Mas a gente se desdobra,

Trabalha com perfeição.

De manhã, acordo bem cedo,

Quando saio ainda tá escuro,

Não importa se tenho medo

Tenho que trabalhar duro.

Então não me aponte o dedo

Não seja assim tão impuro.

Nazinha já está de pé,

Antes de eu mesmo acordar,

Pra preparar o café

E a marmita pra eu levar.

Ela é uma mulher de fé

Em quem eu posso confiar.

Quando conheci Nazinha,

Nazaré, como eu chamava,

Ela era tão bonitinha

Tudo nela me encantava,

Era a filha da vizinha,

Que mamãe tanto gostava.

Nazaré nunca me olhou,

Passava e ela não me via,

Um dia ela me notou

Eu lembro que ela sorria,

Então a gente namorou

E tive tanta alegria.

Certo dia, ela preocupada,

Falou para mim aos prantos,

Disse que estava atrasada,

Os dias não sabia quantos.

Nazinha tava embuchada,

Veja só nossos espantos.

Logo que terminou o susto

Decidimos nos juntar,

Porque sou um homem justo,

Mas não podia me casar

Casamento é muito custo

Que eu não podia pagar.

Então fiz um puxadinho,

Minha mãe tinha o terreno.

Construí só um quartinho,

Que era muito pequeno

Mas era nosso cantinho,

Nosso aconchego sereno.

Então nasceu nosso filho,

Eu me lembro bem do dia,

O Meu olhar teve mais brilho,

Minha vida mais alegria.

Nesse caminho é que eu trilho

O zelo com minha cria.

Tenho um filho para criar,

Isso eu levo muito a sério.

A mulher pra me ajudar

A vida não tem mistério,

Mas é preciso trabalhar,

Faço disso o meu critério.

Ele já começou a escola,

Mas também gosta de brincar,

Mesmo que seja bom de bola

Não vai deixar de estudar.

Botei na minha cachola

Só sai quando se formar,

Mas essa é outra história,

Que um dia será contada

Com a sua própria memória,

Do jeito que for lembrada.

Espero que sua vitória

Seja bem comemorada.

Gravatá, 24/06/2024

Luís Xavier
Enviado por Luís Xavier em 24/06/2024
Código do texto: T8092933
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