A VOZ DA ÁGUA

É a primeira vez que não digo nada.

E nada dizendo, nada digo.

Dizer significa se ausentar do silêncio,

silenciar amarrando os ponteiros do tempo...

O homem calado apenas espia.

Pela fresta muda da quietude

ensaia bocejar como quem lia

um poema miúdo ou a Ilíada...

O canto roufenho se cala

dando à epiglote, descanso.

Como voasse uma bala

na ingravidade, no entanto.

Quieto, o universo dormita.

Em seu vácuo o céu habita.

Cá, no fundo do mais fundo mar,

a voz da água, doce, se põe a cantar.