ME DISSERAM...

Me disseram que um balde só serve para carregar água.

Mas, se enchê-lo de terra e lá aprisionar uma raiz,

verá sua liberdade erguida como estátua

alcançando o alto onde nada a alcança,

chamada pelo nome de flor...

Me disseram, porém, que a liberdade não é só uma conquista,

nem algo valioso que se guarda num cofre cheio de segredos;

mas, sim, o fruto de ações diárias, um bom-dia bem dado,

a mão cedida ao cego para atravessar ruas perigosas,

o aceno a quem vai pelos labirintos da cidade onde mora;

sabê-la soletrar é um dever de todo aquele encarcerado,

viver a liberdade é caminhar levando o coração nas mãos...

Me disseram mais ainda, em letras graúdas e miúdas,

nos livros que escreveram aqueles que se ofereceram

a emprestar a voz aos que são vergastados pela solidão,

nas palavras absurdamente claras que iluminam noites raivosas,

mais ainda, no rio da caudalosa alma humana comum a todos

onde o pescador apanha o que comer e divide o que não lhe falta...