POR ENQUANTO
Sou um sócio da vida,
pago impostos sensoriais,
pago por ser um dos animais
mais completos e estudados,
uma metáfora dos sacrificados
em nome de ciências esotéricas,
morro e nasço para compor a história,
rg, cic, qualquer velho documento
só serve enquanto houver memória,
ando pela cidade turva, adormecida,
pulo e salto obstáculos por outros
colocados, placas, sinais, soldados,
a relativa idade do tempo mascara
as folhas de outono caídas no chão,
sou a espécie feita de água e sabão,
reúno capacidade para crer e crer,
reúno descrenças por pertencer
a uma casta de iconoclastas,
homens enfurecidos dentro do vidro
posto no alto da estante,
serei, daqui a alguns instantes,
o que desce ao Hades desmontado,
sem, ar, sem alma, sem pulso,
feito um boneco por Gepetto montado,
mas, enquanto ainda estou por aqui,
a rir, a chorar, a comer vermelha melancia,
declaro que minha fruta é caqui
e minha leitura preferida é poesia...