Pérola
Cai a noite em abismos colossais
refletida nas águas dos meus sonhos
e tu, que reencontro nos beirais
ou nas asas d'algum pássaro,
emerge do sono e da areia , em nácar,
esculpida em pedra bruta
e se revela e absorve o vento
das negras noites em alto mar.
Tangencia a minha pele, posto que é dor
o sentimento guardado nas entranhas
dessa ostra perdida , em desalento.
Ela se mostra assim, sem mêdo ou pudor
e fala o dialeto das vozes ancestrais
da herança que a recobre inteira ,
levada em tênues redes de pescador.
E ante o assombro e a repulsa
de ver-te assim desnuda e lívida
e perdida, solitária ou muda
eis-me cúmplice desse destino
(ou desatino?)de tuas viagens
para dentro da concha úmida
dos escuros mistérios do teu mar.
Ó concha acostumada a levar
pelo oceano de uma vida toda
as lágrimas, o sal das dores , a paixão
dos náufragos, das mulheres , das rezadeiras,
traze-me tua pérola como alento,
para que se diga que não foi em vão
cada lágrima de amor que derramei inteira.
Marcia Tigani_dezembro 2013