FUGA
Eu não posso fugir de mim mesmo, senão seria o meu próprio abandono. E dessa vida, tão passageira na qual sou viajante de primeira classe, dela também não posso fugir. Eu não posso fugir da minha partida mas me conforto com ela; como me conforto com a partida das pessoas que necessitam prosseguir o seu caminho.
Eu não posso me trancar num quarto escuro, quando o que eu mais preciso é de luz, acompanhada de paz. Eu não possuo o direito de ser infeliz, nem de tornar pessoas infelizes e angustiadas pelos meus erros cometidos ou pensado em cometê-los. Eu não tenho esse direito. Eu não devo acreditar que consegui apenas abrir uma porta, já que existem tantas ainda a serem abertas.
Eu não posso deixar de pensar na importância de tantos e tantos dias, meses e anos futuros que aguardam a minha felicidade de que fujo tanto. Também não tenho esse direito. Como não posso me esconder dos caminhos que hei de conhecê-los e todos eles reservados para mim. Eu não posso fazer de conta que o sol é mentiroso e que a lua não passa de uma farsa que engana os meus olhos, se os dois me mantêm vivo. Não tenho o direito da fuga de mim mesmo, porque sempre vai existir a minha própria captura.