Redecorando
Minha alma é como um cômodo fechado.
Um ambiente em si mesmo enjaulado.
Patamar com cheiro de mofo e abafado.
Escuridão em um piso de pinho desgastado.
Eu estou preso...
Neste sótão há uma porta às minhas costas,
Sei de sua existência, mas não ouso atravessá-la.
Estou sentado, à minha frente a mesa posta,
Olho a refeição, vem o Tempo estragá-la.
Eu estou preso...
No alto, à esquerda, uma janela pequena.
Mesmo quando aberta a luz está encoberta
Pelo nublar da minha existência que domina a cena.
Eu estou preso...
Na escuridão do meu sótão eu só posso olhar de dentro.
Quando ela veio, seria só mais uma sombra.
Quando ela veio, era só mais uma outra.
Mais aos poucos foi entrando, mudando, tramando
E as sombras do meu sótão debandaram.
Ainda estou preso?
Não posso atravessar a porta.
Eu não a quero Morta.
O medo não me deixa olhar para trás.
As moscas sobre a mesa me lembram a história
Do que fiz, de quem sou, de quem faz.
Estarei eternamente preso.
Meu castigo é esse sótão.
Minha morte é esse sótão.
Minha vida é esse sótão.
De piso de pinho desgastado,
De porta trancada às minhas costas
De comida podre à mesa posta
De facho de luz brilhante que entra pela Janela.
Gabriela.
(Poema de Marcos Alencastro)