SÓCRATES SEM RAZÃO

SÓCRATES SEM RAZÃO

 

Trasímaco brigava com Sócrates,

Mesmo se jogassem só bola,

Pois sempre a tolice é consorte,

De toda injustiça ou esmola.

 

A justiça convém ao poder,

Pois só ele é que dita o artigo,

Que nos diz se devemos morrer,

Ou sofrer com tanto castigo.

 

Tudo é o celebrar de um qualquer,

Mas se ele for parte da tribo,

E os que pegam a tudo que quer,

São os frutos do mesmo umbigo.

 

O poder seduz quem não ama,

Pois se ama, partilha o que tem,

Pois o quinto do inferno deu fama,

À ganância que salva a ninguém.

 

Alguns agem como os faraós,

Ao pensar em comprar a passagem,

Mas o ouro não acende um farol,

Nem me serve de porto ou garagem.

 

Só o colo de mãe tem o berço,

Que perdoa, tolera e me ensina,

Sem cobrar o que nunca tem preço,

Pois amar sem temor faz o clima.

 

É por isso que só há uma lei,

E ela se deve ao doce mistério,

E equilibra a tudo o que sei,

Desde o Sol e à cor do minério.

 

Mas se agora chover ou secar,

Eu terei os porques pela regra,

Ou se hoje um carro derrapar,

Devo isso à mão que é cega.

 

Tudo é conivente à ganância,

De quem não entende a vida,

Nem se lembra de sua infância,

E assim segue com a ferida.

 

Nada cura se não percebemos,

A doença que esconde e ilude,

E assim vamos todos perdendo,

A razão que só vem da virtude.

 

Então Sócrates aceita a carne,

Se o dono só come o que quer,

Pois seria razão como a tarde,

E um servo é só um qualquer.