Espelho

Quando o tempo tatuar meu corpo

Com as rugas da idade

E o espelho refletir minha imagem

Tão estranha aos ares da mocidade

Que verão meus olhos cansados?

Uma vítrea personagem sem alma

Dublando um resto de vida?

Uma alma esculpida em bronze

Afrontando, sobranceira,

O inevitável Mistério?

As linhas tão profundas

Sulcando minha matéria frágil

Aumentarão a luz

De minha candeia íntima

Transformando minh’alma

Prenhe de liberdade

Num candeeiro sem fim?

Ó Tempo, eterno coletor de débitos!

Que me cobrará teu aguçado desígnio?

Quando o Tempo tatuar meu corpo

Com as rugas da idade

E minha imagem diluída no espelho

Perder o alento de quem se mira

Indagarei aos anos idos:

Que espectro me reveste o presente:

Anjo ou demônio?

Quando o Tempo tatuar meu corpo

Com as rugas da idade

E no espelho não houver imagem

Que me cobrará a Vida?

Com que peso ou leveza

A Pena da Eternidade

Lavrará minha sentença?