CRENÇA
Acredito num mundo de pessoas boas,
depois de lavadas com Kiboa,
depois de aparados os dentes agudos,
depois de confiscarem os canudos
com os quais sugam o sangue,
vampiras imortais,
depois de nascerem de novo,
sem marcas demoníacas,
sem sinais...
Acredito em governos
que reinem para o povo,
que comam a casca e deixem o bom do ovo
para as bocas famintas, ressecadas,
acredito porque quero acreditar
que não acredito em uma só palavra
que disse acima,
palavras pobres e ricas,
sem e com rimas...
Acredito porque crer é uma das funções
da moral e dos bons costumes,
creio nas queixas contra policiais
que matam negros,
creio nos queixumes
contra os malditos que matam por ciúmes,
mais ainda, creio
que sei porque Deus ainda não veio
punir ou espalhar o perdão,
Ele, que mora nos confins de cada coração,
que cada homem faz valer em sua poesia
a danação ou o escapulir da fria
cela de sua mente,
só assim, creio,
poderá se tornar diferente...
Creio porque ainda estou aqui,
a experimentar o poder da maçã
e da serpente,
porque ainda tenho dentes
para cravar na jugular da imaginação,
para que possa me imaginar
parte importante da criação...
Fé e crença
são como sobremesas
depois que o espírito come
o que tem sobre a mesa,
se alimenta das atitudes diárias,
muda para magnífica essa vida ordinária,
por isso creio no ouro da alma,
no seu veio,
por isso canto essa ode pacífica
a favor de que haja música lírica,
que é o grito transformado,
como se transforma em perdão o pecado...