QUE MAIS?
Que mais o homem pode querer?
Ganhou o céu, o direito de pensar num Deus,
ler livro, comer maçã,
se ferir com lâmina de barbear,
amar com fome de centauro,
escapar da própria mente
mentindo que sente
sem sentir
nada,
diferentemente de quem ama
sem dizer uma só palavra...
Que mais um pode querer a não ser se tornar dois?
Olhar em volta e repovoar lugares inóspitos,
chegar a um consenso sobre a multiplicação dos pães,
ouvir o choro do bebê que um dia foi sua mãe,
agradecer aos filósofos por saber acender o fósforo da imaginação,
ouvir, extasiado, o perdão cumprimentar e perdoar o pecado,
limpar a lente de suas retinas e enxergar, lá na esquina,
o pensamento erguido como edifício de sinapses,
que mais pode querer um homem que sabe
que nada sabe?
Que mais pode querer se aprendeu a sentimentalizar a dor,
a recorrer ao calor quando o frio lhe busca as entranhas,
que mais pode querer alguém que inventou um salvador
para o tirar desta loucura simetricamente insana?