Pela Janela do Trem
Tantas vidas passam por ela
Fiações, arames, aviões, ideias
Uma mistura de cores mexidas, chacoalhadas e batidas
Passam mundos, cidades, favelas e nuvens
Coisas surgem e somem sem que se note
Pequenos universos pessoais, apertados em mentes confusas
Pela janela passam vivos e mortos
Cada um na sua, poucos se notam
Tantas vidas, tantas coisas por fazer
Ecos de seres que não se esbarram
Pessoas que se vão sem deixar rastros
Da janela do trem vejo outras janelas
Que refletem o meu olhar distante
Pela janela eu vejo a chuva que chega aliviando o calor
De relance vejo a flor que se abre escondida na serra
Vejo a dor do adulto, o sorriso da criança
Aquele momento sublime da vida de alguém
Vejo o amor que se acaba na estação do Jaraguá
A despedida, o reencontro, o desencontro
Da janela vejo o que ninguém quer ver
O cuspido e o escarrado, o esquecido e o enterrado
Vejo o tempo que não passa, onde quase posso tocar os ponteiros
Vejo também o que os outros veem
Todos os dias, o tempo todo, a toda hora...
Meu combustível é o movimento
Minha motivação é o cheiro da borracha queimada
Meu caminho é feito de ferro e cansaço
A freada vem sempre sem aviso
É aqui que eu desço
Abro o guarda chuva e me torno apenas mais um
Sigo no ritmo sincopado dos que tem pressa
Uma outra vida qualquer
Sem que se note, sem que se procure saber
Da janela sou apenas mais um observado de longe
Por algum outro protagonista, outro espectador distraído
Um dos tantos sonhadores recostados no vidro da janela do trem
Imaginando a vida lá fora