REFLETINDO ENTRE AS PEÇAS DE UM JOGO

Desde criança, nunca soube o que era poupar, no rio da minha vida não existia escassez, mas isso não significava que tudo era um “sim”.

Foi de cedo, que aprendi que uma das ferramentas do poder era manipular, para se ter aquilo que desejava.

Eu fazia escolhas, traçavas os passos e fazia com que todos atendessem meus caprichos, sem prever as consequências.

Sinceramente nunca desejei o mal de ninguém, apenas desejava meu bem, sem medir as reações em minha volta.

Para mim, a vida era como um tabuleiro de xadrez, só precisava movimentar as peças (pessoas) certas para conquistar o meu objetivo, e sem querer derrubei alguns que entraram na minha frente, e estranhamente senti culpa, mas eu não podia conter meus desejos.

Era como se eu sentisse sede, e para saciá-la bebesse além do que podia suportar, e me afogava nos meus próprios desejos, deixando no curso desse rio muitas mágoas.

Pouco a pouco o poder, as riquezas foram crescendo, sem limites, mas na mesma proporção crescia a sensação de um vazio dentro de mim.

Era como se eu tivesse o dom de me perder todas as vezes que me encontrava.

Tudo que eu queria parecia distante, na realidade os meios não me faltavam, mas o fim, a felicidade, sempre que parecia alcançar, sumia como vapor. Corrompia-me nas ilusões que eu mesmo criava.

Eu era como ventania, uma tormenta que deixava sequelas no caminho, e percebia tarde demais as perdas que eu havia ocasionado com as escolhas erradas.

Novamente abria o tabuleiro de xadrez para mover novas peças, manipulando as pessoas nos jogos de minhas loucuras.

Eu tinha beleza, era bem estudado, uma boa companhia, mas nunca aprendi a conquistar, pois parecia mais fácil comprar tudo o que eu queria, era um vício incontrolável, e na maioria das vezes sem intenção, era tão natural quanto a melodia harmoniosa criada pelo maior músico que se conheceu.

De todas as frustrações que plantei em meu caminho, a maior era que o tempo se esvaía e nada poderia fazer para recuperá-lo.

Quando olhava para o espelho e via as rugas uma a uma tomando conta da minha face, percebia que cada vez mais me perdia nesse jogo, e não aceitava as circunstancias que o senhor do tempo me dizia através dos reflexos da verdade. Na realidade eu sabia que ele estava certo, eu estava me perdendo e perdendo o tempo que me fora dado, me distanciando da felicidade. No reflexo do meu rosto transparecia tristeza e desespero.

Mas como um viciado nas piores drogas, eu não mudava a estratégia, a única forma de jogar que conhecia era o poder e a manipulação, visando à felicidade.

Ia me perdendo cada vez mais, ia destruindo os poucos laços que fiz e que foram sinceros.

Que poder era esse que não sabia preencher as lacunas de um coração cada vez mais fraco?

Foram tantas atitudes equivocadas, que não despertava mais amor ou ódio nas pessoas, apenas indiferença, e nos mais abençoados, a compaixão.

Era como se eu soubesse que de terminada fonte saísse veneno, e descobrisse isso no primeiro gole, mas mesmo tendo a ciência de que aquilo só faria cada vez mais mal, bebia desenfreadamente.

Não há sentido na vida quando vemos que tudo mudou, mas permanecermos nos mesmos erros.

Eu tentava dar desesperadamente um xeque-mate em minha felicidade, antes que o tempo desse um na minha vida.

Leonardo Guimarães Rosa
Enviado por Leonardo Guimarães Rosa em 08/09/2015
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