Acaso

De nada importa quão grande o feito seja,

E se na jornada o dever celeste carrego

Porquanto houver neste mundo o arbitrário

Haverá — não contra, mas necessário —

Na vida, o romance que aos desejos é cego.

É a religião a certeza que o homem almeja,

Não porque é lúcido da vida que há de viver

Ou pela comoção frente o redor que chora quieto.

Não! Aspiram aos céus, pois o caos é decreto

E o valor da vida, na morte hão de esquecer.

Não vi o rei a reclamar da morte prematura.

Nem o choro de fome tirar da terra a comida.

Mas tantas vezes vi mesas fartas e gente obesa

Que faz da semente já infértil, brotar riqueza;

E tanto mártir por vã mentira deixar a vida.

Único deus que tira do Destino a ventura

Acima de qualquer canto, poder ou desejo

Que faz Saturno e minha pretensão, réus

De uma indiferença que excede os céus

E tira dele a esperança que fosse ensejo.

Niilismo estúpido pertencente ao covarde!

Faz-se mal cuidado por um deus irreverente

E chora por quão incerta é a chama acesa,

Enquanto só é certo que da morte és presa

E a brutal realidade faz do cansado um crente.

E piora: desgraçada seja a matemática!

Torna-nos mudos a todos os ouvidos

E cegos às tantas paisagens da Pandora

Faz-nos surdos ao canto que a dor chora

Pois é inexistente o que desconhecido.

Mas ela é coesão que surra, sim, e hora trata

Como a razão que dá olhos e mostram triste verdade

Ao desconhecido efêmero, todo o mundo a todos, pois,

É mundo todo o que é de nada é visível aos faróis.

Que vêem, frente ao mundo, lhes faltar claridade.

Então só que não te fuja a consciente razão,

Mas ria, que se você liga, já está em seu favor

Não, nenhum lírico rogo fará a miséria cessar.

E o pescador não vai ser feliz quando atracar

Mas se lutas pela vida, já vive em ti um vencedor.

Daniel Reis
Enviado por Daniel Reis em 09/06/2015
Reeditado em 05/10/2015
Código do texto: T5271209
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