Colcha de retalhos
Tentando encontrar forças para prosseguir naquela noite fria de inverno, mergulhou em um mar de nostalgia.
Trancou-se em seu quarto e relembrou partes de seu passado.
Recordou-se dos banhos de chuva e do resfriado que vinha junto com eles.
Dos cafés coados e da hiperatividade que ganhava com isso.
Das tardes de Domingo e das noites que antecediam a iminente e triste Segunda-feira.
Do futebol no campinho de terra batida e dos pés machucados por andar descalço.
Dos passeios ao por do sol após a escola e do medo de voltar pra casa “sozinha”.
Das quebras de cofre para esvaziar o mercadinho da esquina e da dor de estômago que tinha como consequência.
De andar de patins na rua sem saída e das quedas no asfalto forrado com cascalhos.
Das brincadeiras ao anoitecer e do voltar pra casa despejando terra com as mãos.
Lembrou da primeira vez que viu uma estrela cadente e do pedido que fez à ela.
Lembrou da tarde em que conseguiu ver a chuva vindo pela cidade em direção ao seu bairro.
Lembrou de uma noite de ano novo onde viu fogos de artifício tomarem conta do céu daquela pacata cidade.
Lembrou do balanço de pneu que tinha na garagem de casa.
Lembrou que sua imaginação fazia o vão entre os sofás virarem um rio de lava.
Lembrou do seu primeiro bicho de estimação e da dor que ela sentiu quando ele teve que deixar esse mundo para descansar em paz.
Lembrou da sua infância e de como tudo resolvia-se mais facilmente.
Joelhos, resfriados, dores e amores eram curados mais rapidamente.
Quis voltar, quis reviver, quis aproveitar.
Despertou.
Colocou as estrelas em uma bolsa.
Guardou o brilho da lua em uma caixa.
As nuvens tomaram diferentes formas.
O céu ganhou novas cores.
A inocência voltara ao corpo de origem.
Sorriu!