Lágrimas de um Dilúvio

Você ainda está viva, ó Terra fatigada?

"Por que isso ocorreu?", pergunta-me já cansada

A ganância, intrometida, juntou-se ao nosso respirar

Muito mais do que o nosso carbono podia suportar

Foram anos e anos dizendo "não é nada demais"

Respirar o mesmo ar que a ignorância não era nada fácil

E esse mesmo ar chegou ao ponto do irrespirável

As cortinas de fumaça anunciam um espetáculo de horrores!

Caiu chuva, uma esparsa chuva

Negra e ácida chuva

Gotas de esperança e liberdade

Em rios agridoces de lágrimas

Lágrimas de um dilúvio

O que será de nós, ó Terra fatigada?

"Então, ainda há tempo?", pergunta-me já cansada

É uma grande cremação aberta ao público, quem tem olhos só veja

E as suas cinzas vão passando de (pul)mão em (pul)mão

É a sua vida, a nossa vida escoando em nossas mãos

O sol poente vermelho envergonha-se; é guerra anunciada

Guerra aos velhos padrões, são ciclos, não há onde fugir

Morra em nós o egocentrismo, e não o que ainda há de vida

Natureza, não a temos, somos nós, eu e ela um só ser

Está chovendo, está chovendo

Respiremos, contemplemos

E cresçamos, e ascendamos

Lave o ar, lave a alma

Contra a correnteza nademos

Contra a ventania voemos

Antes que elas se tornem

Lágrimas de um Dilúvio

(Nota de repúdio pelas queimadas no interior de SP)