Ave, Abismo
Por que se é vida se a taciturna é certa?
Repara minhas mãos
em que os sulcos brincam.
Veias vão se partir
no trabalho insano
da unção extremada.
Sela o lábio ressequido.
Milho aos pombos
na praça do vento fedido.
Onde está minha memória
no saco de lã
do conforto?
Onde está Margarida,
flor da manhã rebelde?
Sou velho como a ferrugem do mijo ácido.
Meus sonhos rivalizam-se
com as trombetas vermelhas do Evangelista.
Não tenho sede espiritual.
Por que se é ainda vida
se a taciturna é casta?
Parte de mim
desperta o paladar do verme.
Parte de mim
se foi no enfastio.
Parte de mim
é vontade.
Parte de mim
ainda não brotou.