BAILAS E FASME LIBRE
Assim, Uxio Novoneyra (Novo Neira),
poeta galego, já falescido (Parada de Moreda,
Courel, Lugo, 19 de janeiro de 1930 - Santiago
de Compostela, 30 de outubro de 1999): «Bailas
e fasme libre».
Por quem o diria, lírico?
Talvez pela que seria a esposa amada. de quem
a maioria dos comentadores nem o nome dão...
Ou por alguma moça que o poeta, que ainda não era,
conheceu em Madrid, já que em Madrid está datado
o poema: 1966.
Portanto, vou imaginar...
Num antro desses nocturnos... escuro mas sedutor...
Música e álcool livres... Mesmo então, em que
no “Reino de España” gozávamos duma ditadura
franca e quase já régia...
Na pista de baile,
dançam elas e eles, descontraídos...
Uxio olha,
contempla, as luzes cegam por vezes, por vezes
iluminam: lá está ela, esplêndida, a mover o corpo
sensualmente conformado, entre as cadências
leves da agitação que o som compassado
da música ordena...
Ela gira desenhando curvas
perfeitas de candor angelical...
Ela rodopia
entre entusiasmos de lascívia inocente...
Ela
move-se com a alegria dos eflúvios nem se sabe
se amorosos ou etílicos, mas, apesar de tudo,
livres, cheios da liberdade que dão os anos moços,
a juventude feliz, os estudos superiores, pausados,
sem pressas, com tino apaziguado de qualquer
teima por conseguir os conhecimentos profundos
em disciplinas que mudarão a existência humana...
Salta, saltita ela, quase gemendo os prazeres
sonhados, os abraços pressentidos, os beijos
que lúbricos, boca com boca, seguirão à dança.
E Uxio contempla, descontraído, gozoso, livre:
Decide começar a ser poeta e pregoa essa
sua declaração de liberdade garatujando
num guardanapo, que acaba de usar: «Bailas
e faisme libre»...
Entende-se: «Bailas e fazes-me
livre.» Fora a chuva também dança livre
no meio e meio da ditadura franquista...