Mijar
Mijar
Quantas vezes, em todos esses anos,
levantei para mijar enquanto tentava escrever poesias.
O ato parece com o grupo destilatório de um navio, que precisa
purificar a água do mar de seus sais,
sob pena de inutilizar as cânulas que circulam internamente nas caldeiras,
entupindo-as e impossibilitando a formação do vapor que move a nave.
A pausa que se impõe ao trabalho,
o som do jato forte batendo no fundo do vaso, o tremelico final,
a balançada e a ordenha do membro para que nada pingue na cueca,
é um intervalo necessário, bastante diferente do que se vinha fazendo,
criando um instante de refrigério e estímulo à emoção estética,
uma possibilidade de avanço,
com pensamentos novos e ênfases antes não pressentidas como necessárias,
para descrever uma dada situação.
Sinto-me assim: bebo para me sentir inspirado.
Mijo para que a bexiga não estoure e a sensação
de beber e escrever, (fumar), não se torne algo desagradável.
Bebendo, fumando, mijando
me inspiro e escrevo muito.
Sigo em frente com meus escritos,
igual a um navio prossigo por “mares nunca d’antes navegados”,
tentando contribuir, com ousadia e pretensão,
na descoberta do belo,
tão encoberto e desconhecido, nas suas várias manifestações.
Quem diria? A essencialidade do ato de urinar ao escrever,
de modo que se possa produzir algo intelectualmente interessante.
Junto com o uísque, o cigarro e as sonatas de Beethoven,
a mijada é, sem duvida, um
ingrediente imprescindível na arte de versejar
extraindo-se, deste mister, inspiração, alegria e satisfação...
Eurico de Andrade Neves Borba, Ana Rech, maio de 2012