Loba em pele de cordeiro

Não via outra forma de comunicar-me com o lobo

na verdade; loba

aquela voraz e predadora.

Gabava-se a loba de não ter (ou não saber expressar) sentimentos

“Bela merda!” pensei comigo

mas sabia ela como enfeitiçar

sabia? Ah! Sabia...

um dia ela me apareceu,

do nada, a me procurar...

se soubesse de seu temperamento 'bombástico'

é certo que teria me arriscado?

Tolo que sou, teria sim!

Minha tolice as vezes supera minhas expectativas.

Mas fomos juntos, passear

eu e a suposta cordeiro.

Teatro primeiro

comer depois (não comeu a chapeuzinho, ainda bem)

mais uma bela caminhada e,

por fim, um gesto de carinho

(anota esse aí, porque foi raro)

eu gostei, confesso

não esqueço que lobos podem sim ter sentimentos

(mas foi só naquele momento)

nunca mais eu vi outra demonstração

até consigo entendê-la

bem pouco, mas consigo.

Não queria vê-la infeliz, mas acho que não era uma condição

creio que se tornou um estado

o carinho, como eu disse, não mais vi

o tempo passou e, por mais duas únicas vezes eu a encontrei,

me cansei.

Antes, ela de mim

brava ao telefone, brava ao digitar

amarga por assim dizer

descobri uma coisa que enfurece lobas:

perguntas!

Mesmo que seja daquelas: “como foi o seu dia?”

fiquei com medo (como diz minha poetisa)

que reação mais estrondosa!

Acho que se estivesse presente

tomaria uma tijolada.

Parei para me perguntar:

“Por que é que eu queria alguém assim?”

sempre pensei que um bom relacionamento

uma boa amizade,

vem da troca.

Você dá o que tem de melhor e recebe o melhor do alguém.

A loba despertou um sentimento ruim em mim,

aquele sentimento de ter que tomar cuidado com tudo

com o que eu falo, com o que eu pergunto, com o que eu penso e peço

com tudo que seria banal para qualquer outro...

pisar em ovos para agradar a loba...

deveria agradar a loba?

Bom, se mesmo sendo loba,

ela soubesse como tratar-me, seria algo feito com prazer

mas...

e a cena final foi assim:

O lobo em forma de cordeiro pôs-se a bradar

a reclamar e a urrar, tão fera quanto nascera

“arruinaste meu final de semana! Irrita-me com tuas

interpelações! És um asno?”

pobre loba...

por que desperdicei meu divino tempo contigo?

“Seria um asno se continuasse a

zurrar atrás de ti! Abandono-te pois,

ao menos até que tenhas respeito.

O mesmo que dei a ti.

O meu pobre final de semana só não foi arruinado

porque tenho outros com boa educação,

aquela que perdeste de vez!”

e para não ser devorado

corri léguas de seus pavorosos

insultos

e, até então, nada soube da voracidade oculta

da loba em pele de cordeiro...

Pedro HD Delavia
Enviado por Pedro HD Delavia em 15/02/2011
Reeditado em 15/02/2011
Código do texto: T2792854
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