IMPLORANDO A SÃO PEDRO
IMPLORANDO A SÃO PEDRO
Onde o cão perdeu as botas,
O velório é diferente,
Põe-se o morto lá na sala,
Onde ajunta muita gente,
Pra se velar o finado,
Não tem salão preparado,
Com os luxos dos viventes.
Zé Bode quando morreu,
Veio toda vizinhança,
Pra passar a noite inteira,
Cochichando e enchendo a pança.
Tomando café com bolacha,
Alguns bebendo cachaça,
Quase virou foi festança.
Não estranhe essa conversa,
Isso é costume por lá,
Só a família é que chora,
Os outros vão xeretar.
Na cozinha, tem banquete,
Não sobra um só tamborete,
Para os da casa sentar.
A morte do pobre Zé,
Não foi grande novidade,
A notícia era Dercy,
Que era então celebridade.
Personagem irreverente,
Teimava em virar semente,
E viver pra eternidade.
Chegaram juntos ao céu,
Dercy Gonçalves e Zé Bode,
O Zé pediu pra entrar,
São Pedro então disse, pode.
Dercy ficou emburrada,
Falou - porra camarada!
Quero voltar; me devolve.
Deixa eu rolar mundo abaixo,
Só parar num pau de sebo,
Roçar nele até o chão,
Cair em pé dando o dedo,
Botar os peito pra fora,
Dizer - cacete eu agora,
Voltei só pra fazer medo.
Fátima Almeida