O MURO
Não é o muro de Berlim.
Não é a muralha da China.
Nem a cerca do México.
Nem assentamento na Palestina.
Não se vê do espaço .
Não é notícia de jornal.
Não é assunto na ONU.
Nada se sabe no Planalto Central.
Ninguém na Terra sabe.
Lá está um mundo dividido.
Uma cerca rasgando a terra.
Uma família em estado de sítio.
É uma cerca pequena e simplória.
Feita de arames e pedaços de pau.
Mas para aquela gentinha sem glória
É mais que o quarto conflito mundial.
Lá não se lança mísseis.
Lá não se sabota avião.
Lá não se seqüestra os líderes.
Lá não se escuta tiros de canhão.
Lá não tem um arsenal de armas.
Lá não tem religião ou ideologia.
Tem uma ignorância embalsamada.
Uma eternidade de pseudo-valentia.
Lá não tem ataques suicidas.
Lá não tem homem bomba.
Tem um exército de línguas ferinas.
Um comandante de conduta infame.
Não tem rio, não tem mar.
Não tem terreno, não tem mangue.
Tem um cemitério e uma capela.
Ainda um chão limpo de sangue.
Não tem riquezas, não tem santo.
Não tem bicho , não tem água na fonte.
Mas pra aquela gente é um eterno canto.
Faz aumentar os olhos da fronte.
Ali não tem sombra , nem raiz.
Ali não tem pessoas importantes.
Mas pra defender o chão sem juiz.
Cada boca é maior que um gigante.
Ali é uma terra seca e inóspita.
Ali tem um bosque de olho grande.
Um leva-e-trás com veneno de cobras.
Disse–me-disse de asas negras e longas.
Naquela guerra não haverá mortos.
Naquela guerra não haverá vencedor.
Todos perderão com as feridas expostas.
Todos se repugnarão com o próprio odor.