Filhas De Maria (Netas Do Carnaval)

Maria nome de batismo

Registro cartorial

Maria Vai Com As Outras

Semente de um samba

De carnaval.

Maria Vai Com As Outras

Todas loucas. Para onde vais?

Maria das Dores passadas

Presentes, futuras, Candelárias

Para onde ir, incansável Amélia

Dos carnavais? Por que parir?

Por amor à vaidade? Para amparar

O corpo em todas as idades?

Marias Vão Com As Outras

Como a de D. Pedro, todas loucas

Não têm idéia para onde ir

Vai Maria das Graças outra vez

Parir. Por que todas parem e não

Param de carpir? Geram criaturas

Apenas para rimar com as flores

Pálidas de bagas amarelas da

Fruta bacupari? Parem para servir

O mercado de fardos do consumir?

Parem para multiplicar os pecados

Tão passados que hão de repetir?

Para alegar ter sofrido por nove meses

As dores nas pernas de ir e vir?

O filho gestado desafiou a gravidade

Ampliou o vinco gótico dos trópicos

Sujo de sangue dos grandes lábios

Berrou sentindo-se indefeso, sozinho

Privado parido expelido, cativo do

Sertão além do líquido amniótico

Onde quisera sempre morar

Lugar telúrico e cósmico

Inalcançável Paraíso Perdido

E agora Maria, para onde vão seus

Filhos? Que companhia vai-lhes

Horizontar o porvir? E se ele não

Quiser ser mais um mestre-sala no

Samba de gala da Marquês de Sapucaí?

Que políticas de vida, Maria, queres

Para eles? Que habitem à beira-mar

Itapoã, Santa Cruz, Cabrália, Troncoso?

Forçá-los a servir esquemas dolosos?

Acaso queres que eles façam festas

Ao Ronaldinho e seus três travestis?

Queres seus filhos cantados para o

Gozo das canções do Caetano Veloso?

Que mínimo respeito terás por eles

Maria? A criança aí está. Quem há de

Amá-la, se todas as mães carregam

A mala pesada do malamar?

Maria, nunca vais saber que a folia

Maternidade embala o berço

Transpessoal de todas as dores

Dessa cidade? A criança recém-nascida

É mais que uma ave perdida

Um cordão umbilical mal cortado

A crocitar agourando o mundo pervertido

De teus afagos, beijos, da graça ligeira

Mágica, de tuas carícias antropofágicas

Súbito berra inutilmente na cidade CO2

Seus gritos ecoam inúteis, desesperadas

Mensagens precoces de uma geração

Padronizada pela sedução do baião de dois

Maria paleolítica, antigo fóssil humano

Com seu astral ancestral afoito

Abrindo as pernas fácil para os homens

Das cavernas em seus apertamentos

No século XXI do ano 2008

Para que essa avidez por parir

Tu, que por milhares de anos

Continuas a mesma temerária da

Idade da pedra lascada? Para quê?

Para ter uma companhia no lar?

Para ter alguém com quem surtar?

Para ter uma criança por trás da qual

Se esconder? (Quem vai ao certo saber?)

Maria Sherazade, Maria Catarina de

Médicis, Maria Julieta de Romeu

Maria Esperteza, nobre assassina dos

Huguenotes na Noite de São Bartolomeu

Tua caverna de parir é a mesma de fazer

xixi. Companhia do sultão das 1001 noites

Suas crianças são mais que utopias

Utopias de marias

De seu deserto de ser.

DECIO GOODNEWS
Enviado por DECIO GOODNEWS em 20/04/2010
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