Tempo, esse ditador!
O tempo parece um trator:
vai cavando sulcos na cara da gente.
O tempo parece máquina:
vai cosendo bolsas sob os olhos da gente.
Parece o tempo um peso:
vai puxando pra baixo a pele da gente.
Vêm cremes, tintas,ginásticas,
dietas, plásticas,
nada detém o tempo.
O tempo parece louco:
vai passando, vai dobrando,
arqueando o corpo da gente.
É mesmo doido esse tempo,
fosse vento, não devastava tanto.
Tem gente que quer enganar o tempo:
Faz trejeitos nos gestos,
revira os olhinhos,
esconde as mãozinhas,
aprende um palavreado mais que jovial;
mas o tempo, esse danado,
fica a se rir da gente,
e a gente fica com cara
de quem não comeu e não gostou.
Ah, se pudesse parar o tempo,
se voltar o tempo possível fosse,
não haveria histórias de ontem,
não caberia a palavra saudade em nenhum poema;
terceira idade, velhice seriam coisa de cinema.
Não ganhariam tanto dinheiro com propaganda
de cremes, lavanda,
coisa vinda do meio da terra,
dos mais altos picos,
achados, titicas
pra espantar o medo
que a gente sente de ficar velho.
Um dia a gente assume a velhice
com cabelos brancos,
mãos trêmulas, manchadas,
dá umas boas risadas,
conta histórias com datas precisas,
sem pudor, escancaradamente.
Vai ver como vai correr
todo pavor; todo susto
vai desaparecer.
A gente vai respirar fundo
o suficiente
pra encher de ar os pulmões.
Vai tossir, espirrar,
vai ter de uma só vez
todos os chiliques guardados,
mas o medo vai passar.
E o tempo, esse danado,
vai andar mais sossegado,
não vai mais parecer adoidado.
Não haverá mais poder de tirano
que nos amedronte ou nos aponte
qual o caminho a seguir.
Iremos soltos, leves, mais lindos,
porque o peso maior, este já sumiu.