O auto fúnebre do sonho

Os dias do infeliz findaram,

Mas quase teve vida real,

A capela mortuária plena,

De uma complacência amena,

Ou medo, a sina de ser mortal.

O pastor que veio e discursou,

Tecendo encômios ao pretérito,

Disse o que tinha pra dizer,

Que mesmo sem acontecer,

O finado tivera algum mérito.

A viúva de olhos pro chão,

Após o último beijo na face,

Recebia palavras sem valor,

Ao menos pra abrandar a dor,

Impossível que ressuscitasse.

Enfim, apagaram a luz de vez,

Sob a tampa, somente escuridão,

Quimera e anelo, desse lado,

Utopia e ilusão, os chegados,

Tomaram as alças do caixão.

Engavetaram o ex da esperança

E não é que a viúva negava o fim?

Jurava que até breve não era adeus,

Que o veria de novo junto de Deus,

Chorava cantando “I have a dream”.