Outro cálice
De que valeu toda luta
Contra a mentira, contra a força bruta?
Se a primeira tentação já te seduz...
Para que não beber desse cálice,
Se ao primeiro assédio
Já bebeste o vinho tinto de sangue?
Será que o pai não ouviu as lamúrias do poeta?
O monstro saiu da lagoa e mostrou a cara;
Apaixonaste por ele à primeira vista...
A fera, que é mais bela que o sonho da quimera,
Saltou do anonimato, da gruta;
E agora tanto faz ser filho da santa
Como ser filho da outra.
Os bêbados do centro da cidade são bisavós,
E, mesmo calada a boca resta o túmulo,
De onde jamais poderão gritar.
Se já era difícil acordar calado, agora...
Ressuscitar então a voz, imagina...
A palavra que estava presa na garganta
Saltou para longe de medo do medo que dá;
Calada, cambaleia por entre sepulcros,
No ermo entre as malditas filosofias.
O grito, por ser calado, é muito mais desumano,
É uma maneira de ser abafado.
Inventaram um pecado maior do que o teu,
Poeta maldito em hora maldita de calar!
O teu veneno foi bálsamo sagrado.
Estás atordoado com o silêncio?
Verás que um filho teu, filho da luta
gora se perdeu nas madrugadas
E podemos lhe chamar filho da outra.
Pai. sirva-nos logo outro cálice, pai;
Sirva-nos logo outro cálice pai;
Sirva-nos logo outro cálice de vinho caro do porto.