Longe de casa
A rua nos atrai como doces na vitrine
E nós fugimos do lar rumo a uma vitrine às avessas
Em busca da liberdade restrita aos vagabundos
Somos parte disso, parte da desilusão que nos espreita na noite áspera
Pelos cantos da mente ela se espreme fazendo cócegas inquietas nas entranhas
A desilusão está sempre lá, esperando para nos dar o bote
Na rua estreita, na estrada interminável, na terra seca
Melhor é não ter esperança de acordar amanhã
Melhor é não alimentar sonhos para queimar no desprazer
As decepções só atingem os que crêem demais
No asfalto frio dos becos ou no barro escuro das vielas
Não existe desilusão, não existe mais nada, só o caos aleatório
Prefiro a sujeira do chão, a sujeira do falso beijo
Prefiro o os ferimentos da pele e da carne
Aos ferimentos da alma corrompida
Melhor é não ter alma pra desperdiçar
Não sou cruel, não ofereço perigo, apenas não sou ninguém
Ninguém com quem qualquer fruto da sociedade confortável deva se preocupar
Sou filho da carne, do álcool, da brisa gelada da noite
Sou selvagem e vivo sozinho
Vivo sem dor, vivo de instintos
Me libertei do sistema e caí na desgraça das ruas
Não me importo, não perdi nada além de ilusões
Prefiro a vida assim, de resto em resto, de noite em noite
Um dia de cada vez, em cada lugar, com cada pessoa
Porque eu escrevo? Escrevo, pois vivo a realidade do caos
E isso me consome por inteiro
O caos me liberta e me aprisiona
Longe de casa, a casa é apenas uma memória vaga
De um lugar onde nunca estive
Nem nunca estarei