À Tua Ptomaína
Horas e horas dirigindo meus sonhos
A teus lábios úmidos e túrbidos,
Que desdenhavam a tantos,
Mas que seguiram seu caminho...
Não sou como um necrófilo que volve
Suas emoções na última morada,
Ou que no fastio servido do viver
Ainda desgasta-se com desejo...
Não vou elevar-te ao pedestal que
Elevadas tantas mulheres fizeram
Os românticos sofrerem por demais,
E se um dia o fizer, não a ti somente elevarei.
E mesmo se não emanar-se a lascívia tumbal,
Raptaria e levaria teu corpo desfalecido
A um tugúrio distante onde pudesse contemplar
Seu colo gélido, sem qualquer repreensão...
Mas bem sei que é ilusão,
Tentar enxergar
O que os outros não percebem,
A tua’lma era putrefeita!
Amor improfícuo sem progênie...
Prognóstico doloroso e ascendente,
Não quiseste a mim...
Não quiseste a minha companhia!...
Não se privou em ergástulos antes,
Mas hoje o que é de ti...
A terra castiga tua vaidade,
E a noite é eterna e sufocante.
A pele começará a esverdear,
E teus gases emanarão...
A classe terás e também estilo,
E eu num grande black-tie pérfido.
Perderás a virgindade pelo verme...
Que primeiro roerá o que era mais belo,
Também fungos e o mal cheiro,
Estarão contigo no amanhã eterno.
Sôfrega, a perfeição não existe...
E tudo o que hoje existe
Amanhã não mais existirá,
Como hoje persiste em existir!
O buquê deflorado murchará...
E os belos cabelos cairão!
Mas mesmo bela da ocasião,
Tu serás amante, amante da terra...
Estarás tão bela como a Marguerite Gautier,
A prostituta de Alexandre Dumas Filho,
Sofrida a sete palmos na volúpia de Armand,
Na certeza da sua extinção privada e involuntária!...
Nem mesmo o amor que tenho
Pode retirar-te desse grande escuro...
Ame enquanto tuas células respiram...
E a ptomaína se resguarda a teu futuro!...