BALA PERDIDA

Eu nunca consegui dizer:

- Eu te amo!

Por isso me fiz anoitecer

a teus olhos atentos

só pra te ver me cobrindo

com teu manto de luz

quando eu, escondido,

chorei invigilante

com medo do escuro

na esperança vã

de que feito lágrima labiríntica

pudesse eu te deixar perdida.

Perdida de amor

por mim.

Então me inventei poeta,

sem sê-lo,

para escrever versos escondidos

e neles, incólume,

declarar meu amor silencioso

na esperança vã

de que feito bala perdida

eles atingissem teu coração.

E tu morresses de amor

por mim.

Mas sequer notaste

com que roupa

eu pra ti me vesti.

Desdourado,

dobrei pela enésima vez

a camiseta púrpura

de fio escócia

com meus versos azuis

e teu perfume rosa

e a devolvi à gaveta branca

da cômoda verde

de minhas esperanças iludíveis.