Cupido coreano
Pyongyang! A flecha ricocheteou
e fincou em meu peito por engano!
Quis tirar, o médico não deixou,
era a seta de um cupido coreano.
Trazia em seu ângulo penetrante
o quebranto de um sol derretido:
ardente, venenoso, delirante
com o câncer do plutônio enriquecido.
Me arranjaram uma camisa bem bizarra
de chumbo e curativos feitos rudes
pra estancar - mas o sangue não jorrava
pelo canto da chaga, só virtudes;
aquelas que pensei terem morrido,
ou estarem enterradas bem no fundo,
como algo nuclear que por perigo
é varrido da superfície do mundo.
Esbanjamento de espasmo e poesia
o orifício transbordava obsessivo
de meu corpo envenenado, que cumpria
seu surto mitológico e radioativo.
Enquanto gazes e mais gazes estancavam
litros de virtudes revividas,
enfermeiras impassíveis descartavam-
nas em baldes e comadres carcomidas.
Protestos insurgiram no planeta,
em templos pagãos ou ruas somente,
diziam faixas, bandeiras e plaquetas:
Kill the cupid, bury the virtues, stop the poetry!
Vênus, Marte, do Olimpo nenhum deus
percebeu deste ser a insanidade
com que tem desafiado mesmo Zeus,
arrojando flechas de radioatividade.
Cupido desgraçado, minha paz
estava em me tornar tão ordinário!
A Terra já não demonstrou assaz
não ser nada disso tudo necessário?
Doutor, acaba de uma vez com a agonia,
retira esta flecha de repente...
Contra virtudes, quimioterapia,
Kill the cupid, bury the virtues, stop the poetry...