TESTAMENTO
TESTAMENTO
Tarcízio Alencar
No dia em que eu fechar os olhos,
Tudo ficará para trás.
O dia em que nasci, a família que me trouxe, os dias que vivi.
No dia em que eu fechar os olhos,
As lágrimas secarão,
As dores passarão,
As doenças serão curadas.
No dia em que eu fechar os olhos,
Vou parar de reclamar,
Parar de chorar, parar de cobrar.
No dia em que eu fechar os olhos,
O que ficou, passou, a família deixou de ser.
Meus “bens”, meu bem, deixarão de ser “meus”!
No dia em que eu fechar os olhos,
Talvez deixem de falar de mim,
Dos meus defeitos tantos...
No dia em que eu fechar os olhos...
Não! Não será bem assim!
Se somos a soma de tudo,
Sou e serei a soma dos meus dias;
Sou e serei a soma das minhas dores, das minhas lágrimas
Dos sorrisos, das alegrias e aprendizados.
No dia em que eu fechar os olhos,
Sou e serei a soma de tudo aquilo que passou nos meus dias,
A soma de todos que passaram por mim: todos somaram!
Gratidão por tudo!
Gratidão a todos!
Perdão pelo que causei!
No dia em que eu fechar os olhos,
Vou recomeçar... após,
E com tudo o que somei, em mim.
Mas, desta passagem, nada posso retocar.
Não posso voltar atrás e consertar nada do que fiz.
No dia em que eu fechar os olhos,
Fiz o que consegui,
Deixei de fazer algumas coisas que poderia ter feito.
Amei na intensidade que consegui,
Descartei amores que devia ter vivido!
Fui bom, fui mal;
Fui justo, fui injusto;
Fui grato, fui ingrato.
Fiz muito e deixei de fazer muito mais.
Aproveitei muita coisa,
Mas, também, muito desperdicei.
No dia em que eu fechar os olhos,
Minha filha, deixo para você,
Uma casinha e um carrinho,
Mas, deixo também, o pouco que eu tinha de bom para te dar.
Ao meu modo te dei educação,
Te dei o que não tive: o amor de um pai.
Pensei em te dar muito e, com certeza,
Não te dei tudo.
Se continuo e tiver merecimento,
Continuarei te dando: amor, carinho e recados.
Obrigado por ter me escolhido por pai,
Mesmo considerando todos os meus defeitos.
Obrigado por ter me dado um neto,
Que é um recomeço de um amor de pai: avô.
No dia em que eu fechar os olhos,
Menina do Pará,
Levarei comigo o conhecimento de um amor inimaginável.
A gratidão de um amor que recebi quando pensava não mais fazer jus.
Quero te dizer que te dei amor;
Quero te dizer que te dei respeito;
Quero te dizer que quando te acolho nos meus braços,
Acolho, mais que teu corpo, acolho a tua alma.
No dia em que eu fechar os olhos,
Você não precisa que eu te deixe nada,
Mas, mesmo assim, te deixarei,
Um exemplo de um homem que te amou,
Te deixo a oportunidade que você teve de conhecer
Um homem com muitos defeitos e, algumas virtudes, talvez,
E que, disto tudo, te deixei alguns modelos.
No dia em que eu fechar os olhos,
Vou te deixar o que, talvez, seja a minha melhor herança:
A semente da Doutrina,
Que caberá a você fazer desabrochar,
Na busca de um “viver melhor”
E de “cortar caminhos”, no caminho da volta ao Pai!
No dia em que eu fechar os olhos...
Mas, que seja feita a Tua vontade Senhor
E não a minha, Amém!